sábado, 29 de dezembro de 2012

Tias de Cascais

No dia de Natal gramei com duas. Foram cerca de noventa minutos. Uns longos noventa minutos.
Uma, mãe da outra.
A mãe engalinhou com o marido, muito discretamente. Ela queria ir embora, ele não. Ela ajeitava o cabelo emproado, ele sentou-se a meu lado pronto a começar uma tertúlia. Tertúlia sobre poesia. Poesia ou teologia. Que sorte a minha.
O senhor, pessoa de muitos estudos e possuidor de uma vastíssima cultura, mexia e remexia as mãos finas e alvas. Sempre que via a senhora sua esposa e o seu comportamento de criança mimada, revirava os olhos cansados. 
Sempre que estou com ele, sinto como se estivesse com um Bispo. Perco o jeito. Tenho de medir todas as palavras que me saem da boca.
A Tia mais nova, quarentona, de uma magreza extrema, a tresandar a tabaco, sentou-se por perto. Tanto ela como o pai, são daquele tipo de pessoas que falam com uma calma que entorpece. A Tia mais velha é o oposto. Parecia excitada.
De repente, apercebo-me que a mais nova parece sucumbir na cadeira. Com voz de passarinho, sussurra: "Hoje não comi nada. Esqueci-me."
Alguém lhe enfiou rapidamente, um prato com uma fatia enorme de bolo nas mãos. O passarinho voltou a piar. Parece que é normal esquecer-se de comer.
E eu sentada, num almofadão, a rezar para que a florzinha não me despencasse em cima, só me perguntava: - Que mal fiz eu?

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